5 de abr. de 2010

O vôo



Goza a euforia do anjo perdido em ti:
Não indagues se nossas estradas, tempo e vento, desabam no abismo.

Que sabes tu do fim?

Se temes que teu mistério seja uma noite, encha-o de estrelas.
Conserva a ilusão de que teu vôo te leva sempre mais para o alto
No deslumbramento da ascenção.

Se pressentires que amanhã estarás mudo
Esgota, como um pássaro, as canções que tens na garganta.

Canta. Canta para conservar a ilusão de festa e de vitória.
Talvez as canções adormeçam as feras
Que esperam para devorar o pássaro.

Desde que nasceste não és mais que um vôo no tempo.

Rumo ao céu?
Que importa a rota.

Voa e canta enquanto resistirem as asas.
Menotti Del Picchia, 1982

Para Marco e Fábio.
Essa poesia me acompanha desde que foi publicada pelo jornal "Folha de S.Paulo" por volta da data em que foi escrita, ao lado de uma matéria sobre Menotti del Picchia, então com seus quase 90 anos. O papel em que copiei está amarelo e manchado pelo tempo. Mas a mensagem que traz, nunca envelhecerá. 



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